ANGOLA DÁ O QUE NÃO TEM: 8 MILHÕES DE DÓLARES PARA A OMS E ZERO PARA OS SEUS HOSPITAIS

Inspirado na reflexão de Laura Macedo, publicada na sua página pessoal no Facebook

Enquanto os hospitais públicos em Angola vivem um colapso progressivo com falta de luz, medicamentos, reagentes e até comida para doentes internados o Presidente João Lourenço, com pompa e comitiva, subiu ao palco da Assembleia Mundial da Saúde da OMS, em Genebra, para anunciar com orgulho uma contribuição de 8 milhões de dólares norte-americanos.

“Angola tem a honra de se juntar aos 14 países africanos que já prometeram contribuições para a Ronda de Investimentos da OMS e tem o prazer de anunciar aqui uma contribuição no valor de Oito Milhões de Dólares americanos (USD 8 000 000)”, declarou.

Este gesto, apresentado como nobre perante a comunidade internacional, soa como ironia amarga para quem conhece a realidade do país: o Hospital do Capalanga, por exemplo, encontra-se há mais de 10 dias sem energia elétrica, impossibilitando qualquer atendimento digno. E este é apenas um entre dezenas de casos espalhados pelo país.

Segundo o Sindicato Nacional dos Médicos Angolanos (SINMEA), muitos hospitais não recebem verbas há meses, os laboratórios estão sem reagentes, e os profissionais de saúde são obrigados a improvisar para salvar vidas, muitas vezes sem sucesso. A mortalidade hospitalar tem aumentado, e os dados da própria imprensa confirmam que pacientes morrem por falta de antibióticos, anestesia e exames básicos.

Recentemente, um ex-Presidente da Namíbia denunciou publicamente a presença de crianças angolanas a mendigar nas ruas do seu país. A resposta do Estado? Nenhuma. Em vez de medidas urgentes para resolver a crise, temos gestos simbólicos em Genebra e espectáculos de desperdício em Luanda.

A pergunta é inevitável: esses 8 milhões de dólares não fariam mais falta aos hospitais, aos médicos e aos cidadãos que morrem por abandono? Para muitos angolanos, o gesto do Presidente parece mais uma jogada de marketing diplomático do que um verdadeiro compromisso com a saúde global muito menos com a saúde interna.

Angola, país com índices de mortalidade materna e infantil ainda alarmantes, parece mais preocupada com a sua aparência externa do que com o seu povo. Um Estado que não garante o direito básico à saúde não pode reclamar “honra” ao doar milhões além-fronteiras.

Como afirma o cientista social Achille Mbembe:

“A governança em muitos Estados africanos pós-coloniais é marcada pela negligência programada onde o abandono se torna política”
(Mbembe, A. Crítica da Razão Negra, 2013)

E, nas palavras do escritor moçambicano Mia Couto:

“A doença mais grave de África não é a malária. É a indiferença dos que mandam. A malária mata aos poucos. A indiferença mata para sempre.”
(Couto, M. Pensatempos Textos de Opinião, 2005)

Este episódio revelou, mais uma vez, o quanto João Lourenço trata o povo angolano com negligência descarada. Ao invés de investir no sistema de saúde que está a desmoronar, preferiu exibir uma imagem de nobreza e grandeza internacional com uma doação que, para o cidadão comum, representa apenas desperdício de recursos públicos.

A Organização Mundial da Saúde, embora simbolize um esforço de saúde global, tem sido alvo de duras críticas inclusive por grandes potências como os Estados Unidos, que já ameaçaram e até chegaram a suspender a sua contribuição, alegando falta de impacto real e politização da organização. Num momento em que o mundo enfrenta epidemias, crises sanitárias e desigualdades no acesso à saúde, a OMS tem tido resultados muito aquém das expectativas.

Mas para um presidente que governa com base na aparência e na encenação internacional, não podia sair de Genebra sem dar o seu “show” de generosidade com dinheiro que nem sequer lhe pertence. Foi um gesto teatral e profundamente hipócrita de quem abandonou os hospitais nacionais para brilhar sob os holofotes da diplomacia mundial.

# Reflexão Final

João Lourenço não apenas doou dinheiro. Ele assinou simbolicamente a certidão de abandono do povo que diz representar. Preferiu alimentar a imagem de um estadista generoso perante o mundo do que saciar a sede de dignidade dos seus próprios cidadãos. Do que vale o discurso em Genebra, quando a realidade em Luanda é de dor, escuridão e silêncio nos corredores hospitalares?

É tempo de o povo angolano deixar de ser espectador da própria miséria. A saúde não pode ser palco para vaidades presidenciais. Não há diplomacia que justifique uma criança a morrer sem atendimento por falta de um antibiótico de 1.000 kwanzas.


Henda Ya Xiyetu
Criador de Opinião

“Sou um criador de opinião , sempre trazendo reflexões e perspectivas sobre temas importantes que impactam nossa sociedade. As opiniões expressas são pessoais e buscam provocar reflexão crítica e construtiva.”
🚨👀🇦🇴🇦🇴👀🇦🇴👀🇦🇴👀📌 ANGOLA DÁ O QUE NÃO TEM: 8 MILHÕES DE DÓLARES PARA A OMS E ZERO PARA OS SEUS HOSPITAIS Inspirado na reflexão de Laura Macedo, publicada na sua página pessoal no Facebook Enquanto os hospitais públicos em Angola vivem um colapso progressivo com falta de luz, medicamentos, reagentes e até comida para doentes internados o Presidente João Lourenço, com pompa e comitiva, subiu ao palco da Assembleia Mundial da Saúde da OMS, em Genebra, para anunciar com orgulho uma contribuição de 8 milhões de dólares norte-americanos. “Angola tem a honra de se juntar aos 14 países africanos que já prometeram contribuições para a Ronda de Investimentos da OMS e tem o prazer de anunciar aqui uma contribuição no valor de Oito Milhões de Dólares americanos (USD 8 000 000)”, declarou. Este gesto, apresentado como nobre perante a comunidade internacional, soa como ironia amarga para quem conhece a realidade do país: o Hospital do Capalanga, por exemplo, encontra-se há mais de 10 dias sem energia elétrica, impossibilitando qualquer atendimento digno. E este é apenas um entre dezenas de casos espalhados pelo país. Segundo o Sindicato Nacional dos Médicos Angolanos (SINMEA), muitos hospitais não recebem verbas há meses, os laboratórios estão sem reagentes, e os profissionais de saúde são obrigados a improvisar para salvar vidas, muitas vezes sem sucesso. A mortalidade hospitalar tem aumentado, e os dados da própria imprensa confirmam que pacientes morrem por falta de antibióticos, anestesia e exames básicos. Recentemente, um ex-Presidente da Namíbia denunciou publicamente a presença de crianças angolanas a mendigar nas ruas do seu país. A resposta do Estado? Nenhuma. Em vez de medidas urgentes para resolver a crise, temos gestos simbólicos em Genebra e espectáculos de desperdício em Luanda. A pergunta é inevitável: esses 8 milhões de dólares não fariam mais falta aos hospitais, aos médicos e aos cidadãos que morrem por abandono? Para muitos angolanos, o gesto do Presidente parece mais uma jogada de marketing diplomático do que um verdadeiro compromisso com a saúde global muito menos com a saúde interna. Angola, país com índices de mortalidade materna e infantil ainda alarmantes, parece mais preocupada com a sua aparência externa do que com o seu povo. Um Estado que não garante o direito básico à saúde não pode reclamar “honra” ao doar milhões além-fronteiras. Como afirma o cientista social Achille Mbembe: “A governança em muitos Estados africanos pós-coloniais é marcada pela negligência programada onde o abandono se torna política” (Mbembe, A. Crítica da Razão Negra, 2013) E, nas palavras do escritor moçambicano Mia Couto: “A doença mais grave de África não é a malária. É a indiferença dos que mandam. A malária mata aos poucos. A indiferença mata para sempre.” (Couto, M. Pensatempos Textos de Opinião, 2005) Este episódio revelou, mais uma vez, o quanto João Lourenço trata o povo angolano com negligência descarada. Ao invés de investir no sistema de saúde que está a desmoronar, preferiu exibir uma imagem de nobreza e grandeza internacional com uma doação que, para o cidadão comum, representa apenas desperdício de recursos públicos. A Organização Mundial da Saúde, embora simbolize um esforço de saúde global, tem sido alvo de duras críticas inclusive por grandes potências como os Estados Unidos, que já ameaçaram e até chegaram a suspender a sua contribuição, alegando falta de impacto real e politização da organização. Num momento em que o mundo enfrenta epidemias, crises sanitárias e desigualdades no acesso à saúde, a OMS tem tido resultados muito aquém das expectativas. Mas para um presidente que governa com base na aparência e na encenação internacional, não podia sair de Genebra sem dar o seu “show” de generosidade com dinheiro que nem sequer lhe pertence. Foi um gesto teatral e profundamente hipócrita de quem abandonou os hospitais nacionais para brilhar sob os holofotes da diplomacia mundial. # Reflexão Final João Lourenço não apenas doou dinheiro. Ele assinou simbolicamente a certidão de abandono do povo que diz representar. Preferiu alimentar a imagem de um estadista generoso perante o mundo do que saciar a sede de dignidade dos seus próprios cidadãos. Do que vale o discurso em Genebra, quando a realidade em Luanda é de dor, escuridão e silêncio nos corredores hospitalares? É tempo de o povo angolano deixar de ser espectador da própria miséria. A saúde não pode ser palco para vaidades presidenciais. Não há diplomacia que justifique uma criança a morrer sem atendimento por falta de um antibiótico de 1.000 kwanzas. Henda Ya Xiyetu Criador de Opinião “Sou um criador de opinião , sempre trazendo reflexões e perspectivas sobre temas importantes que impactam nossa sociedade. As opiniões expressas são pessoais e buscam provocar reflexão crítica e construtiva.”
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